Conversa sobre o Sol
- não percebo.
- não percebes o quê?
- as roupas, por exemplo. Porque estão vestidos com cortinados?
- talvez fosse moda. Ou estivesse muito calor. Ou não existissem agulhas. Não sei. Mas os romanos tinham o mesmo problema, vestidos com lençóis.
- e os sapatos? Nem umas sandálias?!
- podiam ser naturalistas. E vegetarianos, provavelmente.
- não sei. Mas também não percebo o porquê da estaca a sair do olho do da esquerda, e as estranhas posições em que têm as mãos.
- estou a ficar aborrecido.
- eu também. Mas esta gravura inquieta-me.
- eu também ando inquieto.
- então? o que se passa?
- além de estar aborrecido por estar há meia hora a olhar para isto, é o que tu sabes.
- bolas, ainda ela?! andas há uns 2 anos nisso, esquece lá o assunto.
- não consigo. Quero, mas não consigo.
- começa a parecer-me uma obsessão.
- entre a minha e a tua com o quadro grego, não sei qual a pior.
- a minha é recente.
- e a minha é esparsa.
- se calhar estão a falar de mulheres.
- ou de homens. Naquele tempo havia muitos gays.
- mais do que hoje?
- não sei. Mas dizem que eram muitos.
- eram hedonistas. Tens de os desculpar.
- a mim parece-me filósofos. Todos os filósofos se vestiam assim.
- com cortinados?
- ou lençóis, não sei. Assim.
- se calhar estavam a falar da luz. Podiam estar a falar do Sol.
- podiam. Ou de mulheres. Ou homens.
- estás a começar a aborrecer-me, tu.
- estou a pensar nela. Vi-a há dias, está gira.
- mas queres alguma coisa com ela?
- não.
- então porque não esqueces isso? Seja isso o que for?
- não consigo.
- e ao menos sabes porquê?
- acho que sim.
- e…?
- não é quem ela é. É quem ela não é.
- agora podias estar a falar da gravura.
- é. Tens razão. Podia.
- aposto que um deles é o Pitágoras.
- vamos embora.
- sim. Vamos.
(mote por AS)