sábado, 4 de janeiro de 2003



Mas eu pensava que o Natal já não tinha nada de religioso!!! Não é patrocinado por um tal de pai de Natal que veste de vermelho e que trabalha para a Coca-Cola? :-)
(isto também não é azedume, já agora :-)). Por mim, dispenso. Juro que sim.

Fui ao cinema ver A Residência Espanhola. É um filme engraçado, sobre um grupo de pessoas a participar no Programa Erasmus em Barcelona. A juventude louca e desregrada, a vida toda pela frente, etc. No final, e no primeiro dia de trabalho, o protagonista, a quem esperava um futuro a trabalhar na Comissão Europeia num prédio habitado por cubículos, foge a correr como louco. Decide que aquilo não é para ele, e dedicar-se ao que realmente queria fazer: escrever. A sensação de liberdade, de fuga, etc. Filme "feel good".
Eu não sou já um tipo muito idealista, e muito menos ingénuo (infelizmente?), mas de vez em quando uns laivos de juventude e revolta ainda me percorrem as sinapses, de forma que fiquei um pouco revoltado com o simpático filme. O rapaz protagonista foge de uma vida aborrecidinha como são talvez grande parte das nossas, das "pessoas normais reais", vai fazer o que quer, escrever!!! Claro que a sensação de liberdade se transmite ao público.

Mas e depois? Se calhar daí a uns 20 anos está transformado num Luiz Pacheco (veja-se o que se descobre quando se procuram páginas sobre este escritor) revoltado e se calhar a viver de dinheiro emprestado por amigos. A minha ingenuidade transformou-se em cinismo, confesso. Este tipo de filme, incontestavelmente "agradável" de ver, é verdade que não deixa de ser de alguma forma poeira para os olhos. A grande maioria das pessoas que ali estava tem uma vida cubicular (independentemente de estar ou não contente com a mesma), e vai ali para sentar-se numa cadeira às escuras durante duas horas, para ser transportado para uma história alheia... mas que vivemos como nossa, e que nos faz sentir muito muito bem.

Portanto, como ver isto? De uma forma ingénua: a nossa vida é isto, temos de o aceitar, por isso qualquer "consolo" de como não é... é positivo de encorajar. De uma forma cínica: as nossas vidas podiam ser muito, mas muito melhores, e filmes como estes acabam por ser poeira para os olhos (independentemente de haver ou não intenção) que nos fazem aceitar a realidade como ela acaba por nos ser imposta. Vivemos como na Matrix, numa realidade virtual contentinha que nos cega para uma outra.

Boeuf. Isto faz-me sentir jovem e ingénuo. Daqui a pouco drogo-me, embebedo-me, e torno-me num poeta urbano revoltado. Raios. O pior é que já deixei passar os 27 anos, já não posso morrer por overdose na Idade dos Mártires! :-(

NP: Massive Attack, um CD que ainda não saiu e que por isso na realidade não estou a ouvir.



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